segunda-feira, 26 de abril de 2010

A leitura como terapia

“Todo leitor é, quando lê, o leitor de si mesmo.” A frase de Marcel Proust resume perfeitamente a busca velada no ato de abrir um livro. Procuramos a nós. Buscamos o nosso íntimo, aquilo que somos, do que somos feitos. Qual matéria nos define. Redescubro reiteradamente essa verdade quando revisito agendas velhas, de um tempo quando havia tempo para minuciosa e cuidadosamente registrar frases, orações e trechos que falaram à minha alma. São tantos. E em alguns não me leio de todo: apenas prevejo algo que nem sei bem de mim. A mais recente incursão aconteceu na noite de sábado, depois de descobrir que neste mês Clarice Lispector completaria 90 anos se estivesse viva (http://migre.me/zoVx). Revirei páginas e páginas à procura das palavras que em mim se disseram. E essa busca nunca é vã. (Leda Balbino)


“Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: ‘você fica com o livro por quanto tempo quiser’. Entendem? Valia mais do que me dar o livro: ‘pelo tempo que eu quisesse’ é tudo que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer” (Clarice Lispector/ conto: Felicidade Clandestina - livro homônimo)

“Amizade é matéria de salvação” (conto: Uma Amizade Sincera – livro: “Felicidade Clandestina”)

“A prece profunda não é aquela que pede, a prece mais profunda é a que não pede mais” (conto: Os Desastres de Sofia – livro: Felicidade Clandestina)

“Tudo se entrelaçou, confundiu-se dentro de mim e eu não saberia precisar se meu desassossego era o desejo de Daniel ou a ânsia de procurar o novo mundo descoberto. Porque despertei simultaneamente mulher e humana” (conto: “Obsessão” – livro: “A Bela e a Fera”)

“’Una Furtiva Lacrima’ fora a única coisa belíssima em sua vida. Enxugando as próprias lágrimas tentou cantar o que ouvira. Mas a sua voz era crua e tão desafinada como ela mesma era. Quando ouviu começara a chorar. Era a primeira vez que chorava, não sabia que tinha tanta água nos olhos. Chorava, assoava o nariz sem saber mais por que chorava. Não chorava por causa da vida que levava: porque, não tendo conhecido outros modos de viver, aceitara que com ela era ‘assim’. Mas também creio que chorava porque, através da música, adivinhava talvez que havia outros modos de sentir, havia existências mais delicadas e até um certo luxo de alma” (livro: A Hora da Estrela)

“Enquanto isso as nuvens são brancas e o céu é todo azul. Para que tanto Deus. Por que não um pouco para os homens” (livro: A Hora da Estrela)

“Experimentei quase tudo, inclusive a paixão e seu desespero. E agora só quereria ter o que eu tivesse sido e não fui” (livro: A Hora da Estrela)

3 comentários:

  1. Adoro Clarice!!!!!

    Vcs já firam a peça com a Beth Goulart? Com trechos dos textos dela? Estou louca para ver, vou no domingo agora, no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo.

    Beijos, meninas. Escrevam mais!!!!

    Isa (ou Bela - A Divorciada)

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  2. Isa, que bom receber seu comentário! Ainda não vimos a peça com a Beth Goulart, mas adoramos a sugestão. Já está na agenda! Bj.

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